segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Texto sobre a questão ambiental recebido de um amigo

Quando foi lançada num Fórum a pergunta sobre o problema da pesca profissional e seus desdobramentos, eu disse que era assunto para um tratado e que o resultado do debate poderia ser utilizado para um projeto de lei. Prometi também naquela resposta, que eu ia fazer a minha parte.
Deixei a questão colocada daquela forma, no ar, esperando que o assunto fosse tratado com a seriedade e profundidade que, entendo, mereça receber de todos nós pescadores esportivos preocupados com os estragos que vemos acontecer à nossa volta.
A participação não foi no nível que eu esperava. Uma ou outra resposta apenas abordando a questão de forma mais séria.
Desde aquele dia venho dando tratos à bola, buscando um jeito de colocar no papel uma análise e um “ameaço” de proposta para essa encrenca toda. Vamos só ver se eu consigo ser coerente o bastante.
O problema ambiental, no Brasil e no mundo, tem uma única raiz: a crescente aglomeração do homem em ambientes urbanos, com as conseqüências todas que isso provoca.
A primeira, talvez a mais importante delas, é o quase aniquilamento da preocupação ambiental no homem urbano. Morando nas cidades ele acaba se isentando de responsabilidade quanto aos problemas ambientais, achando que esses são problemas de quem vive no campo ou no mato. Gente de cidade, vivendo no asfalto e no concreto não tem nada a ver com o que acontece com florestas, águas e animais. Conseguem alguns mais iluminados perceber que a poluição do ar tem alguma coisa a ver com chaminés e automóveis...
Mas de modo geral, não tem a menor consciência de que é o seu consumo urbano o real causador das pressões todas sofridas pelo ambiente natural. Ele come palmito, mas é um vidrinho por mês, usa uma tábua para fazer uma prateleira, mas é uminha só e ele não corta nenhuma árvore, pois compra na loja de material. Acende a luz, lava a calçada com esguicho, mas é com água da Sabesp que ele paga no fim do mês. Atende a esposa e troca os móveis da sala, mas comprou no MixMóveis.
Come só um tucunaré por ano, mas é comprado no Carrefour ou “cobrado” de um amigo que foi pescar, e não tirado do Rio Negro. Ele não faz nada que agrida o ambiente natural...
Não alcança que a água e a luz provocaram barramento de rios e impediram piracemas, que suas tábua e móveis derrubaram árvores no Mato Grosso. Que a Nota Fiscal dessas compras é papel que despejou lixívia em algum rio e que o tucunarezinho à toa saiu do rio junto com alguns milhões de irmãos, para atender milhões de consumidores apenas um tucunaré, como ele, que tem seus desejos atendidos por alguns milhares de caboclos que só conseguem um dinheirinho quando mandam de lá o que ele consome aqui.
A questão ambiental já é profusa e profundamente estudada por uns quantos organismos públicos e mereceu um sem número de leis de proteção e regulação de atividades consideradas predatórias.
Até leis completíssimas sobre Educação Ambiental já temos, desde a 6938/81 até as 9597/99 e 9960/00 que tratam da Política Nacional de Educação Ambiental, estabelecendo, veja só que bonito, que essas questões tem que constar de todos os currículos, em todos os níveis, como Temas Transversais. Lindo!!!
A Constituição de 88 tem um capítulo formidável sobre o meio ambiente. Fizemos aqui a Eco 92 e participamos da Rio+10 lá em Johanesburgo.
Nossa legislação ambiental é considerada uma das mais completas do mundo, mais abrangentes e profundas que na maioria dos países ditos desenvolvidos.
Mas é só papel...e papel a gente usa até no banheiro!
Temos o IBAMA federal e uns não sei quantos órgãos estaduais correlatos, responsáveis pela fiscalização de atividades predatórias, que até varinha de bambú tomam da gente, preocupados que são com o meio ambiente...
E com isso tudo, vamos levando com a barriga, nos dando por satisfeitos com o aparato legalista que, dos gabinetes, garante a integridade de nossos maravilhosos recursos naturais.
Eles cuidam da natureza e nós vamos levando nossa vidinha aqui no asfalto, bem longe desses problemas.
Tudo se resume na questão da Educação Ambiental, já prevista nas leis e cuja implementação até já existe em alguns projetos piloto. Aplicados integralmente, esses projetos seguramente mudarão todo o quadro que vemos hoje.
Mas nossos recursos naturais será que têm “gás” para agüentar o tranco, enquanto criamos, nos bancos de escola, a consciência ecológica de umas três gerações sucessivas?
Com certeza terão se esgotado antes disso...
Qualquer solução rápida o suficiente para provocar resultados antes que os danos sejam irreversíveis, obrigatoriamente tem que passar por ações mais contundentes e diretas, algumas delas com certeza mais antipáticas que aquelas previstas na legislação existente.
Entendo que uma, talvez a única solução plausível para provocar os reflexos imediatos necessários, deva começar pela atuação firme e simultânea em alguns pontos distintos:
- política enérgica de estímulo ao turismo de pesca esportiva voltado às áreas que hoje sofrem pressão sem controle, implementando a prática obrigatória do pesque e solte
- aplicação de programa intensivo de educação ambiental
desenvolvida junto aos caboclos e ribeirinhos nas regiões alvo do turismo estimulado, transformando-os de coletores em administradores de recursos naturais, fazendo-os entender que manter o peixe na água é mais lucrativo que mandá-lo ao mercado e a única forma de fixar o homem nessas fronteiras de modo digno. Fazendo com que vejam que isso é verdade, com o estímulo ao turismo de pesca na região.
- fiscalização e coerção enérgicas das atividades predatórias
a fiscalização não precisa se deslocar rio acima e abaixo atrás dos pescadores, pois pode ser exercida de modo muito mais eficiente e com relativamente poucos recursos, desde que concentrada nos pontos de convergência da pesca turística ou comercial, como por exemplo os portos ribeirinhos usados como ponto de partida e chegada dos barcos hotel na Amazônia e no Pantanal, além de nos pontos de embarque dos turistas que retornam para casa. A coerção deve ser severa, incluindo a apreensão de materiais e imposição de multas que deverão ser pagas nos próprios pólos de pesca, aliada à redução das possibilidades de recurso pelos infratores.
Quais são os destinos de pesca no Brasil? Identificados, concentremos neles as ações ao invés de dispersar os poucos recursos existentes em lugares onde até os lambaris já são raros.
No que diz respeito à pesca marinha, acredito que o pescador amador não provoque prejuízos ambientais, desde que entendamos a pesca nas regiões estuarinas e de manguezais como áreas internas, tratadas da mesma forma que Pantanal e Amazônia.
Quanto à pesca comercial no mar, a fiscalização nos portos e entrepostos de comercialização de pescado, se bem executada, cumpre perfeitamente seu papel. Fiscalização de fato nas grandes redes de distribuição desses produtos, nos Carrefour, Ver-o-Peso e Extra da vida. Apreenda-se algumas vezes os lotes fora de tamanho ou de época permitida, com a aplicação de multas que sejam de fato cobradas, e acredito, sinceramente, que a maior parte do problema seja resolvida, sem que seja necessário colocar um monte de gente mar a fora fiscalizando barquinho de pescador.
É essa a minha opinião. Lógico que cada um dos pontos que eu abri tem que ser desdobrado e detalhado, de forma a compor um programa completo, com atribuição de responsabilidades que incluam organismos de representação da sociedade civil. É muita pretensão de minha parte lançar uma proposta como essa? Pode até ser, mas acho que a questão ambiental no Brasil é tratada de forma morna, bem estilo “prá inglês ver”. Como em medicina, para um problema agudo o ataque tem ser enérgico e bem pontuado.
Com as ações concentradas, os resultados localizados naturalmente aparecerão mais rapidamente, servindo de exemplo e estímulo à implementação de programas gerais como os já previstos na legislação já existente. Exemplos isolados e bem sucedidos já existem na Amazônia, na região das Anavilhanas e na Ilha de (ou do?) Marajó, tendo como foco básico o tucunaré e o pirarucú. O que precisamos fazer é ajustar o alvo e o ritmo, tratando a questão ambiental como o problema agudo que é.
Estes comentários, que eu já estendi além do razoável neste nosso espaço, abordam apenas a questão da pesca e a questão ambiental no Brasil transcende esse campo.
Mas em todas as áreas correlatas (que acabam sendo interligadas e interdependentes) acho que essa mesma linha de ação seria aplicável.
Vou ficando por aqui, remoendo os azedumes provocados pela nossa impotência perante o quadro. Podemos fazer alguma coisa de concreto além de ficar no “jus esperneandi”? Quem sabe se agora, após essas eleições em que o Partido Verde, de boa estratégia, conseguiu colocar alguns parlamentares na Câmara Federal, encontremos um pouco mais de espaço para agir de fato.

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